Resenha do documentário “The True Cost”
- vitoriapinheiro5
- 29 de dez. de 2021
- 4 min de leitura
Escrito por: Vitória Pinheiro
Dirigido por Andrew Morgan, o filme intitulado “The True Cost: Who Pays The Real Price for YOUR Clothes” ou em tradução para o português “O Verdadeiro Custo: Quem Paga o real Preço pelas SUAS Roupas” é um documentário investigativo acerca da exploração dos trabalhadores na indústria da moda. A obra revela as violações dos direitos humanos que acontecem nas fábricas, as colocando em contraste com o consumismo desenfreado. Não somente pautando as problemáticas do processo de produção de fast fashion, mas também as suas consequências para o meio ambiente.
Com várias entrevistas com ambientalistas, trabalhadores da indústria, donos das fábricas e pessoas que promovem a produção sustentável de roupas, o documentário é marcado por um compilado de depoimentos dessas entrevistas, somado à narração, e a cenas gravadas pelo Andrew ou retiradas de jornais televisivos. Foram colhidas informações e entrevistas em treze países para sua execução, e ao estrear em 2015 o filme foi premiado no Festival de Cannes.
Ao examinar o sistema de fast fashion implantado nos últimos anos ao redor do mundo, que torna o processo de consumo e de descarte cada vez mais rápido, o diretor faz a ligação entre ele e fatores como o consumismo, globalização, capitalismo, pobreza e opressão. Operando majoritariamente em países em desenvolvimento, como é o caso de Bangladesh e da China por exemplo, fabricantes de grandes marcas de roupas minimizam os custos e aumentam os lucros ao terem empresas locais competindo.
Muitas vezes, as marcas internacionais tendem a pressionar os donos das fábricas, ameaçando mudar a fabricação das roupas para outro país caso os preços não sejam baratos o suficiente. Por conseguinte, os trabalhadores recebem salários e condições de trabalho extremamente baixos. Como é citado no próprio documentário, o desamento do prédio comercial Rana Plaza em Bangladesh deixou mais de mil trabalhadores mortos, que inclusive já haviam relatado sobre os riscos que o prédio estava apresentando, mas que foram obrigados a continuar a trabalhar.
Outro exemplo retratado no longa-metragem é a história de Shima Akhater, uma jovem de 23 anos que trabalha em uma fábrica de roupas em Bangladesh e ganha 10 dólares por mês, um total de 857 na moeda local. No filme, vemos o processo de despedida dela e de sua filha Nádia, que teve de se mudar para viver com outros familiares pois a mãe trabalhava por longos períodos, e gostaria de que a filha tivesse mais oportunidades. Em um momento, Shima diz que algumas vezes não tinha outra opção a não ser levar a filha consigo para a fábrica, mas que não queria fazer isso para não expor a criança aos químicos tóxicos do local de trabalho. A jovem só consegue ver os pais duas vezes ao ano, e não vai mais poder criar a sua própria filha para se sustentar.
“As pessoas não têm ideia do quão difícil é para nós fazermos as roupas. Eles só compram e usam. Eu acredito que essas roupas são feitas com o nosso sangue. Muitos trabalhadores morrem em diferentes acidentes, como há um ano atrás em que houve o desabamento do Rana Plaza, muitos trabalhadores morreram lá. É muito doloroso para nós. Eu não quero ninguém usando nada produzido pelo nosso sangue”. Esse foi um dos depoimentos marcantes de Shima, que alegou já ter unido um grupo para lutar pelos seus direitos trabalhistas, mas que ao elaborarem uma lista de exigências para os gerentes, eles foram atacados e espancados de várias formas, seja com cadeiras ou tesouras.
Do outro lado do mundo, norte-americanos que trabalham para empresas de fast fashion afirmam que não há nada intrinsecamente perigoso em costurar roupas, e que haveriam coisas piores que pessoas como a Shima poderiam fazer. Para eles, os baixos salários, condições de trabalho perigosas e desastres nas fábricas podem ser justificados, já que apesar dos malefícios, são criados vagas de trabalho para pessoas que não têm alternativa. O preço desse sistema agora globalizado é, tantas vezes, o benefício para a economia de países ricos como os Estados Unidos.
Como a produção e suas consequências se situam em países de terceiro mundo, enquanto o dinheiro se concentra nos EUA ou na Europa, a desigualdade cresce. As marcas trazidas por esse modelo de fabricação se traduzem em, de um lado pessoas ignorantes quanto a como o que elas consomem diariamente é feito e o porquê de ser tão barato, o que contribui para que consumam cada vez mais, e do outro, pessoas pobres em situação de risco de vida e saúde, que se expõem o dia todo a produtos tóxicos.
Essa disparidade faz com que esses locais sejam completamente opostos, assim como o pensamento das pessoas que residem neles. O glamour de Nova Iorque e seus vários telões de propaganda sobrevive, enquanto os resquícios da produção dos itens da moda são despejados em países oprimidos como Bangladesh, junto as massivas quantidades de resíduos que já saíram de moda tão rápido quanto entraram. Em síntese, é possível constatar o que a jornalista Lucy Siegle já antes afirmou “Fast fashion não é de graça. Alguém em algum lugar está pagando por isso”.
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