“Moda em tempo real” da Shein: uma análise do consumo excessivo de fast fashion
- vitoriapinheiro5
- 29 de dez. de 2021
- 4 min de leitura
Escrito por: Vitória Pinheiro

De acordo com Annie Leonard, escritora do livro “A história das coisas”, não é possível executar um sistema linear por um período indefinido em um planeta finito. Ou seja, levando em consideração que os recursos disponíveis no planeta são finitos, o sistema de produção em massa e o consumo excessivo não poderiam perdurar indefinidamente. Todavia, é visto que o aumento da produção e da demanda de produtos crescem. No quesito da indústria da moda isso é bastante acentuado. Com o advento do padrão fast fashion, em que os produtos são feitos, consumidos e descartados rapidamente, e a atual praticidade e agilidade dos serviços de comércio on-line (Ecommerce), o número de vendas dobrou de 100 para 200 bilhões de unidades por ano mundialmente. Enquanto que o número de vezes em que um item foi usado diminuiu em 36% consoante a organização Earth.
Inegavelmente, as estratégias de marketing que persuadem os indivíduos inseridos na sociedade de consumo estão em todas as mídias, da televisão à internet. Em consequência dos novos meios digitais, o aumento da produção de artigos de moda em contraste com a diminuição do tempo de uso se dá em parte por consequência dos influenciadores digitais. Nas redes sociais os influenciadores ganham popularidade ao usar e avaliar artigos de vestuário e demais produtos. Com a popularização do TikTok, uma rede social que funciona a partir da criação e difusão de vídeos curtos, houve o aumento do consumo tanto dos influenciadores quanto da audiência. A partir de hastags como #sheinhaul é possível ver exemplos de influenciadores de todo o mundo que compram massivamente artigos da marca para avaliar ou criar vídeos de moda a cada semana. Entretanto, é importante ressaltar que a pandemia e o isolamento social também foram fatores que ocasionaram o crescimento das vendas virtuais. A junção de todos esses aspectos contemporâneos promoveram a fama desenfreada de uma forma de “ultra fast fashion” através de lojas virtuais como é o caso da marca chinesa Shein.
O sucesso da Shein se deve às baixas taxas de preço dos itens, assim como também pela rápida disponibilização de artigos que são tendência no momento. A marca internacional foi fundada por Chris Xu em 2008 e atualmente tem o valor de 15 bilhões de dólares segundo a revista Forbes. Com a queda na popularidade das marcas de fast fashion de varejo físico, como é o caso das marcas Zara, H&M e Forever 21 e a ascensão de um novo modelo de mercado de “moda em tempo real”, a fast fashion se tornou cada vez mais rápida, quase que instantânea. O intuito de replicar as tendências assim que elas surgem diminui a qualidade dos produtos e reduz os custos de produção para que esses itens sejam barateados para os consumidores, ocasionando impactos devastadores para o meio ambiente e violações graves dos direitos humanos.
A rápida eliminação de estoque para suprir as novas tendências da moda corrobora para a eliminação de emissões de carbono na atmosfera, do mesmo modo que o consumo excessivo feito pela população. Com o aumento do consumo, há também o aumento do descarte de peças consideradas como “ultrapassadas”, as quais já foram expostas excessivamente nas redes. Infelizmente, peças de segunda mão não são tão populares quanto a compra de novos itens. O descarte de peças resulta em mais poluição considerando ainda os gases e resíduos tóxicos que são eliminados ou despejados de maneira incorreta e ilegal durante a fabricação destas. Igualmente destrutivo é o processo de extração de matérias primas e utilização de recursos do planeta para realizar a produção, considerando que para fabricar uma só camisa são necessários 3 mil litros de água. Por conta dos artigos de fast fashion serem majoritariamente produzidos em países ainda em desenvolvimento e que dependem de carvão e gás, a indústria têxtil é considerada como a quarta mais poluente do mundo.
Para efetivação da produção em grande escala da indústria da moda, as condições de trabalho são baixíssimas. Tanto que já foi constatado que esta é o segundo maior setor a contribuir com as práticas de escravidão moderna, segundo a organização Walk Free. A escravidão moderna pode se dar através do trabalho forçado, tráfico humano e tantas outras formas. Ainda consoante a Walk Free, 40.3 milhões de pessoas foram vítimas desse tipo de crime em 2016. Com as mulheres como maioria, alguns dos países com condições inumanas de trabalho são China, Coreia do Norte e Vietnã. Ao consumir produtos de fast fashion seja em lojas físicas ou lojas virtuais, como é o caso da Shein, os consumidos inevitavelmente se tornam apoiadores indiretos desse tipo de prática, justamente por sustentarem a sua continuação através do lucro.
Em suma, são necessárias mudanças para a efetuação de sistemas que sejam menos prejudiciais ao planeta e à sociedade. De fato, apesar de a responsabilidade não se atrelar inteiramente ao consumidor, que há anos vem sendo persuadido pela mídia de massa, é cabível ressaltar a importância do papel que ele possuí dentro do capitalismo. Ao se conscientizarem acerca das problemáticas do consumo excessivo e apoiarem marcas que são transparentes acerca de sua cadeia de suprimentos, de maneira a consumir apenas para suprir suas necessidades básicas, poderão se extinguir assim marcas que negligenciam os direitos de seus trabalhadores e o compromisso para com a preservação do meio ambiente. Pois, como afirma a professora Valquíria Padilha “É uma contradição chamar nosso sistema atual de produtivo, quando é extremamente destrutivo - do começo ao fim da cadeia”.
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